quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O Princípio Constitucional da Legalidade e o Princípio Civil da Irretroatividade da Lei em relação a contratos enviados aos Tribunais de Contas

O artigo 37 da Constituição Federal, em seu caput, traz o seguinte preceito:

“A administração pública, direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade (...)”

A Análise Processual nº 00299/2007 feita pela 1ª Inspetoria Geral de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso do Sul, mencionou afronta ao Princípio Constitucional da Legalidade pelo fato de ter notado retroação na data de início da prestação de serviços referentes ao Contrato nº 068/2007, da Prefeitura Municipal de Brasilândia-MS.

A retroação gera incertezas em relação a processo licitatório e a formalização do instrumento contratual, pois caracteriza falhas, ou seja, sugere que a contratação acontecera antes da licitação.

Caracterizado tal fato, o princípio da legalidade encontra-se atingido, pois, como leciona Meirelles:

"A legalidade, como princípio de administração, (Const. Rep., art.37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei.

Na Administração Pública, não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei na proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa "pode fazer assim"; para o administrador público significa "deve fazer assim".

As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública, e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contém verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos. Por outras palavras, a natureza da função pública e a finalidade do Estado impedem que seus agentes deixem de exercitar os poderes e de cumprir os deveres que a lei lhes impõe. Tais poderes, conferidos à Administração Pública para serem utilizados em benefício da coletividade, não podem ser renunciados ou descumpridos pelo administrador, sem ofensa ao bem-comum, que é o supremo e único objetivo de toda a ação administrativa."

Assim, o princípio da legalidade restringe a atuação pública aos ditames legais, resguardando diretos pessoais e coletivos.

No caso em questão, o que deve ser respeitado pela Administração é a Lei nº 8.666/93, que, além de reger as normas aplicáveis aos processos licitatórios, impõe todas as condições necessárias às contratações públicas.

Em relação ao Princípio Civil da Irretroatividade da Lei, temos que tal princípio fora atingido, por não ser permitido em nosso ordenamento jurídico tal prática.

Etimologicamente, a palavra retroatividade significa "atividade para trás"; juridicamente, dizemos que uma norma retroage quando vigora não somente a partir da publicação, mas, ainda, regula certas situações jurídicas configuradas anteriormente. Sendo retroativa, a lei volta ao passado, retroage, recua.

O princípio da irretroatividade das leis ampara-se na necessidade da segurança das relações jurídicas e constitui a regra de que a retroatividade vem a ser a exceção.

A doutrina de Paul Roubier e Planiol foi a escolhida pelo nosso direito positivo, consoante se depreende do art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Paul Roubier, no problema da retroatividade das leis, refere-se a três planos temporais bem definidos em que a lei pode vir a atuar: passado, presente e futuro. Cada uma destas três etapas admite um determinado efeito. Considera-se efeito retroativo a aplicação da lei nova ao passado, isto é, aos fatos anteriores à sua existência.

Efeito imediato da lei no presente aos fatos ainda não consumados, pendentes. Efeito diferido é a aplicação da lei velha a fatos futuros, mesmo após sua revogação. Assim, o efeito imediato e geral se destaca; no dizer de Roubier, a lei nova se aplica à situação jurídica ainda não constituída, imediatamente. Se a situação jurídica já estiver consolidada ao entrar em vigor a lei nova, esta respeitará, então, tais efeitos e sobre eles não incidirá.

Segundo a LICC, como vimos, adotou-se o efeito imediato e geral da lei, a partir de sua vigência, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, princípio constante da CF, art. 5º, XXXVI.

Portanto, no caso em questão não cabe no contrato a menção a data anterior a assinatura do mesmo, por estar ofendendo tal princípio. A retroatividade da lei só faz parte do ordenamento penal brasileiro e somente quando for para beneficiar o réu.

Sendo assim, seria necessário o encaminhado um documento de correção contratual, com datas que garantam, sem gerar incertezas, a licitude do r. contrato.